quarta-feira, 15 de outubro de 2014

30 dias sem sexo.


Estarrecedor é deparar-me com a contagem dos meus dias de abstinência. Não foi uma escolha consciente estar há exatos 30 dias sem sexo. A ausência de outros corpos se deu naturalmente pelo meu corpo próprio. Quando olhei a porta do meu quarto hoje, senti a total apropriação das minhas mãos por ser a única que a abriu e a fechou esses dias. No fundo eu não estou sem sexo, porque transo comigo todos os dias, mas só o meu desejo com o meu desejo se encontra.
Meu sexo não é dócil. É da vontade de dominar, por isso não é piedoso. Quando meu líquido vaginal encontra provador, meu martelo bate sobre a mesa e sinto uma verdade que domino por instantes. Não se trata de regras, mas de proteção de espécie. Não há mais paladinos de amor, nem declarações. Meu ato de fervor me consome, porque ardi intensamente e causei faíscas e chamas. Tanta sede desse rio que engasgar foi inevitável. É quase um ácido essa água que ofereço.
Meu sexo existe para desamar outrem e experimentar a dúvida e a perda. Meu sexo quer deixar partir, ainda que com critérios, para ser elegante.  Eu tenho saudades de todos aqueles corpos, mas isso não muda nada, pois é evidente que meu gozo tem vazão e quase nunca razão. Quando será que o sexo me dominou? Meu sexo não é mais uma arte ou uma paixão. Nem a imagem dionisíaca de um espetáculo inacabado. Por onde anda minha agenda? Talvez perdida dentro de um sapato que não cabe calçar agora para não se sujar de lamas. Meu sexo está atravessado por uma agulha de costura que não tem linha, não tece, não junta. Meu sexo está arbitrário e não quer seguir rotinas de domingo. Meu sexo parece desaparecer como se nunca tivesse sido visto por ninguém.
Meu sexo foi saqueado por exploradores que não conseguiram levar minha terra. E agora não quer fazer escambo, nem empréstimos. Também não exige devolução de bens.
Meu sexo quer ser anarquista, mas não sabe ainda. Ele saiu de casa.
para que?
para onde?
Meu sexo está caminhando sem rumo, quase perdido, reconhecendo notoriamente sua decadência. Meu sexo aprendeu a importância da sua própria ausência.